terça-feira, 27 de março de 2012

O CONTEXTO E O PRETEXTO DA SOCIOLOGIA

Agora é o momento de abordar quando surgiu a Sociologia, o contexto da época e como os sociólogos se distinguem dos profissionais de outras áreas. A Sociologia nasceu no século XIX, um século marcado por dualidades:
 
1º de um lado, a ideia de progresso. Difunde-se a ideia de que a história da humanidade não só caminha em uma direção, mas que esse caminho apontava uma evolução - essa evolução era o progresso da humanidade.
  
 
Pessoas que viveram o período chamavam a própria época de "uma era de mudanças", um "século de transições" (GAY, 1998, p. 43). Uma das características do século XIX é a de que a própria natureza das mudanças se modificou, elas tornaram-se muito mais rápidas. Não só ocorreram as grandes imigrações para a América, como a migração do campo para a cidade. A mistura de grandes avanços de um lado, e miséria, fome e exploração de outro, fez com que as pessoas começassem a sentir um sentimento generalizado de desordem, uma sensação de estar à deriva, sem rumo (GAY, 1998). Tratava-se, portanto, de uma época marcada por “dilemas sociais” (FERNANDES, 1980, p. 27), e a Sociologia surge como ciência preocupada em construir explicações a respeito da sociedade e de suas transformações.
 
A palavra "Sociologia" nasceu por volta de 1830 na França, cunhada por Augusto Comte. Assim como outros homens de sua época, Comte via a sociedade como estando em crise e achava que a função da Sociologia seria a de resolver a crise do mundo moderno, isto é, fornecer um sistema de ideias científicas que presidiria a reorganização social. A Sociologia era entendida de forma ampla e incluía parte da Psicologia, a Economia Política, a Ética e a Filosofia da História (cuja discussão caberá a outra temática). Contudo, é preciso adiantar que hoje ela é uma Ciência autônoma com relação a todas essas acima citadas.
 
Achava-se que o mundo moderno estaria em crise, devido ao contexto da época, da Re¬volução Industrial e de rápida urbanização.
 
A Revolução Industrial havia começado no século XVIII, mas suas consequências para a vida das pessoas se fizeram sentir com mais força somente no século XIX. Ela está relacionada ao desenvolvimento de um sistema fabril mecanizado que produz quantidades tão grandes e a um custo tão rapidamente decrescente que não precisa mais depender da demanda existente, pois ela cria o seu próprio mercado. A indústria automobilística ajuda a entender isso. Não foi a demanda por carros em 1890 que criou a indústria de porte que hoje conhecemos, mas a capacidade de produzir carros baratos - isso é que fomentou a atual demanda em massa. Inclusive, no início, muitas pessoas tinham medo dos carros.
 
Nos grandes centros urbanos, a Revolução Industrial disseminou a miséria e o descontentamento, e assim, na segunda metade do século XIX, não eram só os operários que estavam descontentes com os parcos salários, os pequenos comerciantes também estavam descontentes. Não viam que o problema não eram as máquinas em si, mas todo um siste¬ma econômico que estava se alterando.
 
No início da Revolução Industrial um dos fatores que atraíram os trabalhadores e os fizeram deixar os campos eram os salários mais altos e a liberdade que a cidade trazia. Karl Marx mostra que um fator importante para essa migração para a cidade foi a concentra¬ção da propriedade com o objetivo de aumentar as pastagens para a criação de ovelhas, para a produção da lã destinada às manufaturas.
 
A redução da margem de lucro, ocasionada pela competição, fazia com que o preço dos produtos caísse e muitos empresários, para diminuir os custos de produção, passaram a contratar mulheres e crianças, cujos salários eram muito mais baixos do que os dos homens. A Revolução Industrial alterou o modo de vida das pessoas, trouxe novos costumes, novos hábitos, novos valores. Ela mudou também o ritmo de vida das pessoas. Este sempre fora dado pela luz diurna, fazendeiros e artesãos começavam e terminavam o seu dia, em geral, com o amanhecer e o crepúsculo.
 
Com a disseminação da energia elétrica, o dia passou a ser encompridado artificialmente (antes o gás, o óleo e a vela já faziam isso, mas eram caros). O tempo passou a ser controlado, curvando-se à vontade dos homens. Ele foi regularizado, dividido e homogeneizado. As fábricas passaram a funcionar em turnos e as pessoas começaram a trabalhar à noite. Um último ponto a respeito da industrialização: ela trouxe consigo a disciplina fabril, ou seja, o homem não trabalhava mais ao sabor do clima e das estações, agora deveria aprender a trabalhar de maneira adequada à indústria, ou seja, em um ritmo regular de trabalho diário ininterrupto e que é inteiramente diferente dos altos e baixos provocados pelas diferentes estações no trabalho agrícola.
 
Acompanhando a Revolução Industrial ocorria o processo de urbanização, com o desenvolvimento das cidades, que se tornaram o palco dessas transformações e cresce¬ram de forma desmesurada. Ocorreu um esvaziamento do campo. As pessoas não só atravessavam oceanos, como também partiam do campo para as cidades em busca dos meios para sua sobrevivência ou de melhores condições de vida. Paris tinha quase 600 mil habitantes em 1800. Em 1850 tinha mais de 1 milhão, e em 1900, mais de 2,5 milhões (GAY, 1998, p. 45).
 
O século XIX pode ser compreendido como a era dos trens expressos. Os trens eram a metáfora das rápidas mudanças. Sua velocidade servia como símbolo para a velocidade das mudanças. E assim dinamizaram ainda mais as transformações (por meio deles os jornais passaram a chegar cada vez mais rápido aos lugares mais distantes e assim a informação pôde se difundir com mais velocidade). Eles beneficiaram também a indústria, ajudaram a baixar o custo do transporte da produção e as mercadorias perecíveis puderam ser transportadas de forma mais ágil.
 
Eles impuseram uma precisão ao tempo que nunca antes houvera. As cidades tiveram de acertar seus relógios. Antes deles, cada cidade marcava as horas como bem queria. (GAY, Peter. Arquitetos e mártires da mudança. In: A Experiência burguesa da rainha Vitória a Freud. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. p. 54-55).
 
Em meio a tudo isso surgiu a Sociologia. Ela veio, nesse primeiro momento, não só para compreender, mas também para reformar a sociedade. Afinal de contas, a pobreza existente nas sociedades industriais não era mais vista como um problema natural, um castigo da natureza ou da Providência, mas, sim, fruto da exploração excessiva, ou seja, um problema social. A Sociologia nasceu como uma ciência da sociedade industrial (BOTTOMORE, 2008, pp.19-21), mas os pais da Sociologia não concordavam entre si quanto aos métodos a ser empregados, nem quanto ao objeto dessa ciência.
 
A falta de um entendimento comum por parte dos sociólogos sobre a sua ciência possui, em boa medida, uma relação com a formação de uma sociedade dividida em antagonismos de classes. A existência de interesses opostos na sociedade capitalista penetrou e invadiu a formação da Sociologia. [...] O caráter antagônico da sociedade capitalista, ao impedir um entendimento comum por parte dos sociólogos em torno ao objeto e aos métodos de investigação desta disciplina, deu margem ao nascimento de diferentes tradições sociológicas ou distintas sociologias, como preferem afirmar alguns sociólogos (MARTINS, C. Benedito. O que é Sociologia. São Paulo: Brasiliense, 2003; Primeiros Passos, pp.34-35).
Logo, a Sociologia, desde o seu início, não foi marcada pelo consenso, mas por intensos debates entre diferentes correntes de pensamento. Existiam desde as correntes que procuravam explicar a sociedade a partir de seus fundamentos econômicos (como Karl Marx), e outros, como Max Weber, que realizavam uma interpretação causal da cultura e da história. Havia também perspectivas teóricas que explicavam a sociedade a partir de um princípio do equilíbrio e de uma tendência à integração, como Émile Durkheim, ou outros que viam a sociedade a partir das contradições e antagonismos que separavam os indivíduos.
 
Como agora já estamos assentados sobre uma base sólida quanto ao contexto do surgimento da Sociologia e de suas tensões, é possível explicar a distinção entre Sociologia e outras disciplinas como o Serviço Social ou a Filosofia. São muitos os que as confundem. Por isso se faz necessário estabelecer uma distinção entre elas. No que se refere ao Serviço Social, pode-se dizer que a Sociologia se distingue dele, pois ela é uma tentativa de compreensão da realidade, ao passo que o serviço do assistente social é sempre uma ação na sociedade (BERGER, 1976, p. 13).
 
Também se faz necessária a distinção entre Sociologia e Filosofia. A Filosofia tam¬bém estuda o homem, entretanto suas preocupações normalmente dizem respeito mais a abstrações do que a uma compreensão dos homens imersos dentro de contextos históricos específicos.
 
A título de exemplo para melhorar a compreensão: um questionamento filosófico sobre a realidade pode passar pelas seguintes questões: O homem é livre? O que é liberdade? Tais questões são muito genéricas e não se preocupam tanto com as especificidades dos diferentes homens e mulheres em sociedades distintas.
 
Na verdade, a Filosofia trata muitas vezes com um conceito genérico de homem, pois se preocupa mais com a humanidade. Já o sociólogo se preocupa com questões especificas a determinados contextos históricos. A abordagem do tema "liberdade", quando é feita por um sociólogo, pode partir, por exemplo, das seguintes questões: Qual é a concepção de liberdade dos japoneses? Há diferença no Brasil atual, na forma de entender o que é a liberdade entre pessoas de camadas médias e os ricos? Ou seja, há a preocupação em compreender os homens em momentos históricos e culturais específicos.
 
 
 
Fonte:____________
(SÃO PAULO-SEE, Caderno do professor: sociologia, EM, 1ª S., V.1, pp.42-44)
2º por outro lado, viam-se as mudanças não como sinal de evolução, mas, sim, de desordem (GAY, 1998; MARTINS, 2003).

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